quarta-feira, 3 de agosto de 2011

STJ - Taxa judiciária e custas não incidem sobre meação

RECURSO ESPECIAL Nº 898.294 - RS (2006⁄0236697-8)
RELATOR    :    MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO
RECORRENTE    :    ÉLIO MÁRIO OPPELT - ESPÓLIO
REPR. POR     :    VERA LÚCIA OPPELT - INVENTARIANTE
ADVOGADO    :    FABIANA FRANCO TRINDADE E OUTRO(S)
RECORRIDO     :    HELENA THEREZA OPPELT
ADVOGADO    :    LUIZ CLEBER MARTINS DA SILVA E OUTRO(S)

EMENTA

DIREITO CIVIL E TRIBUTÁRIO. INVENTÁRIO. TAXA JUDICIÁRIA. BASE DE CÁLCULO. HERANÇA. EXCLUSÃO DA MEAÇÃO DO CÔNJUGE SUPÉRSTITE.
1. Taxa judiciária e custas judiciais são, na jurisprudência sólida do STF, espécies tributárias resultantes "da prestação de serviço público específico e divisível e que têm como base de cálculo o valor da atividade estatal referida diretamente ao contribuinte" (ADI 1772 MC, Relator(a): Min. CARLOS VELLOSO, Tribunal Pleno, julgado em 15⁄04⁄1998, DJ 08-09-2000 PP-00004 EMENT
VOL-02003-01 PP-00166).
2. Em processo de inventário, a toda evidência, a meação do cônjuge supérstite não é abarcada pelo serviço público prestado,  destinado essencialmente a partilhar a herança deixada pelo de cujus. Tampouco pode ser considerada proveito econômico, porquanto pertencente, por direito próprio e não sucessório, ao cônjuge viúvo. Precedentes.
3. Assim, deve ser afastada da base de cálculo da taxa judiciária a meação do cônjuge supérstite.
4. Recurso especial provido.


ACÓRDÃO


A Turma, por unanimidade, deu provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.Os Srs. Ministros Raul Araújo, Maria Isabel Gallotti e João Otávio de Noronha votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília (DF), 02 de junho de 2011(Data do Julgamento)
MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO
Relator

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator):
1. Cuida-se, na origem, de agravo de instrumento interposto por Vera Lúcia Oppelt contra decisão que, no inventário dos bens deixados por Élio Mário Oppelt, determinou o recolhimento da taxa judiciária sobre todo o acervo patrimonial. Sustentou o agravante, em síntese, que a taxa judiciária não deveria incidir sobre a meação da viúva, porquanto o objeto do inventário é a herança deixada pelo de cujus, excluído o patrimônio do cônjuge subrevivente.
Foi negado provimento ao agravo de instrumento, nos termos da seguinte ementa:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. SUCESSÕES. INVENTÁRIO. TAXA E CUSTAS. INCIDÊNCIA SOBRE A MEAÇÃO.
A taxa judiciária e as custas processuais incidem sobre a importância total dos bens do espólio, incluindo a meação da cônjuge supérstite.
AGRAVO DESPROVIDO. UNÂNIME. (fl. 73)
Os embargos de declaração opostos foram rejeitados (fls. 111-114).
Sobreveio recurso especial apoiado nas alíneas "a" e "c" do permissivo constitucional, no qual se alega, além de dissídio, ofensa ao art. 1.034, § 1º, do CPC.
Em síntese, sustenta a recorrente que da base de cálculo da taxa judiciária deve ser excluída a meação do cônjuge sobrevivente.
Sem contrarrazões, o especial foi admitido (fls. 150-152).
Ascendendo os autos a esta Corte, foram eles distribuídos inicialmente ao Ministro Luiz Fux, tendo a Primeira Seção, em "Questão de Ordem", declinado da competência para uma das Turmas integrantes da Segunda Seção (fls. 156-159).
É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator):
2. Inicio por afirmar a competência desta Turma para julgar o recurso.
Não obstante a existência de precedentes sobre o tema oriundos da Primeira Seção desta Corte, e muito embora a controvérsia imediata diga respeito à taxa judiciária devida, de caráter evidentemente tributário, a celeuma se instalou em relação jurídica de direito privado, qual seja, o inventário dos bens deixados por Élio Mário Oppelt, circunstância que atrai a incidência do art. 9º, § 2º, inciso XII, do RISTJ.
Esse entendimento foi sufragado pela Corte Especial no CC 87.898⁄MT, Rel. Ministra ELIANA CALMON, julgado em 01⁄10⁄2008, DJe 30⁄10⁄2008).
Mutatis mutandis, também é da competência das Turmas da Segunda Seção a controvérsia concernente a retenção de imposto de renda, sempre que a relação jurídica subjacente seja de direito privado, como é o caso da discussão relativa à possibilidade de retenção do imposto por ocasião do pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais e de indenizações (AgRg no Ag 1063512⁄RS, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, QUARTA TURMA, julgado em 04⁄06⁄2009, DJe 15⁄06⁄2009; REsp 1012843⁄RJ, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 05⁄11⁄2008, DJe 17⁄02⁄2009).
3. No mérito, a controvérsia diz respeito à base de cálculo da taxa judiciária em processo de inventário, tendo entendido as instâncias ordinárias que esta deve incidir sobre o monte-mor, incluindo-se aí a meação do cônjuge sobrevivo.
3.1. Contudo, não há motivo para que a taxa judiciária incida sobre a totalidade dos bens do casal, sem a exclusão da meação do cônjuge supérstite.
Taxa judiciária e custas judiciais são, na jurisprudência sólida do STF, espécies tributárias resultantes "da prestação de serviço público específico e divisível e que têm como base de cálculo o valor da atividade estatal referida diretamente ao contribuinte" (ADI 1772 MC, Relator(a): Min. CARLOS VELLOSO, Tribunal Pleno, julgado em 15⁄04⁄1998, DJ 08-09-2000 PP-00004 EMENT
VOL-02003-01 PP-00166).
Em processo de inventário, a toda evidência, a meação do cônjuge supérstite não é abarcada pelo serviço público prestado, destinado essencialmente a partilhar a herança deixada pelo de cujus.
Tampouco pode ser considerada proveito econômico, porquanto  pertencente, por direito próprio e não sucessório, ao cônjuge viúvo.
Nesse sentido, colho os judiciosos fundamentos do voto proferido pelo eminente Ministro Luiz Fux, na relatoria do REsp. n. 437.525⁄SP:
Sobreleva notar que a Taxa Judiciária tem por fato gerador a prestação de serviços públicos, de natureza forense. Sua cobrança visa à remuneração de serviços processuais. Sua base de cálculo é o conteúdo econômico objeto da causa. Sob esse enfoque, conquanto o tributo em questão não guarde qualquer pertinência com o Imposto de Transmissão causa mortis, sua base de cálculo deve se pautar pelo valor do benefício que se vai auferir com a prestação jurisdicional,
Com efeito, a Taxa Judiciária, no processo de inventário, não deve ser calculada sobre o monte-mor, neste incluído o montante relativo à meação do cônjuge supérstite, a qual, não constituindo patrimônio do de cujus, não se enquadra no conceito legal de herança, objeto da ação em debate, não é objeto do serviço público prestado, e, conseqüentemente, da base de cálculo da citada Taxa.
A meação, não constituindo herança, se apura mediante corriqueiro cálculo aritmético, destacando-se do monte-mor, partilhável a ser considerado para fins de divisão quando ultimado o processo de inventário.
O patrimônio pertencente ao cônjuge sobrevivo, que, frise-se, não se reputa parte da herança, não integra o processo de inventário ou arrolamento, senão para efeito de identificação da porção disponível, quinhão hereditário, este sim alvo da divisão entre os herdeiros. Sendo a meação estranha à sucessão, não há como, à luz do princípio da capacidade contributiva, pretender que o valor desta seja computado quando do cálculo do tributo em tela. Deveras, não fazendo parte da herança, não é objeto da prestação dos serviços públicos de natureza forense, cuja remuneração se faz por meio da Taxa Judiciária.
Cumpre salientar ainda que os limites da tributação que ora se apresenta são definidos pelo conteúdo econômico  do objeto da causa, sobre o qual ela é calculada. Sobressai extreme de dúvidas que o objeto da causa no processo de inventário não é a segregação da meação do cônjuge, mas a apuração da herança e a conseqüente partilha entre os herdeiros. Dessarte, sendo apenas conseqüência prática da causa, não há como se apurar o tributo levando-se em consideração o valor da meação do cônjuge supérstite (REsp 437525⁄SP, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 20⁄11⁄2003, DJ 09⁄12⁄2003, p. 216).
E foi nessa direção que a jurisprudência da Casa caminhou de forma uníssona:
TRIBUTÁRIO – INVENTÁRIO – TAXA JUDICIÁRIA – BASE DE CÁLCULO – EXCLUSÃO DA MEAÇÃO DO
CÔNJUGE SUPÉRSTITE – RECURSO ESPECIAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. No processo de inventário, a Taxa Judiciária deve ser calculada sobre o valor dos bens deixados pelo de cujus, excluindo-se a meação do cônjuge supérstite.
2. Não se enquadra no conceito legal de herança a meação pertencente ao cônjuge sobrevivo.
3. Recurso especial improvido.
(REsp 343.718⁄SP, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 19⁄05⁄2005, DJ 20⁄06⁄2005, p. 185)
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TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. DECISÃO LASTREADA EM DOIS FUNDAMENTOS, INATACADA EM UM DELES. MANUTENÇÃO. INVENTÁRIO. TAXA JUDICIÁRIA. BASE DE CÁLCULO. MEAÇÃO. INCLUSÃO.
1. O efeito devolutivo do recurso especial implica em que fundada a decisão em dupla motivação, deve ser mantida quando o recorrente logra infirmar apenas um deles, restando o outro inatacado.
2. A Taxa Judiciária tem por fato gerador a prestação de serviços públicos, de natureza forense, por isso que sua cobrança visa à remuneração de serviços processuais e a sua base de cálculo é o conteúdo econômico objeto da causa.
3. A Taxa Judiciária, no processo de inventário, não deve ser calculada sobre o monte-mor, neste incluído o montante relativo à meação do cônjuge supérstite, a qual, não constituindo patrimônio do de cujus, não se enquadra no conceito legal de herança não é objeto do serviço público prestado, e, conseqüentemente, da base de cálculo da citada Taxa.
4. Recurso Especial provido.
(REsp 437.525⁄SP, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 20⁄11⁄2003, DJ 09⁄12⁄2003, p. 216)
_________________________
Finalmente, é de se ressaltar que o próprio STF assentou que a cobrança da taxa judiciária sobre o monte-mor poderia, inclusive, incidir em bitributação, o que é vedado pela CF⁄88:
A escolha do valor do monte-mor como base de cálculo da taxa judiciária encontra óbice no artigo 145, § 2º, da Constituição Federal, visto que o monte-mor que contenha bens imóveis é também base de cálculo do imposto de transmissão causa mortis e inter vivos (CTN, artigo 33) (ADI 2040, Relator(a): Min. MAURÍCIO CORRÊA, Tribunal Pleno, julgado em 15⁄12⁄1999, DJ 25-02-2000 PP-00051 EMENT VOL-01980-02 PP-00240)
4. Diante do exposto, dou provimento ao recurso especial para afastar a meação do cônjuge sobrevivente da base de cálculo da taxa judiciária.
É como voto.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO

QUARTA TURMA
Número Registro: 2006⁄0236697-8   
PROCESSO ELETRÔNICO    REsp 898.294 ⁄ RS
Números Origem:  10505177211           113950621             70014000004           70015597883
PAUTA: 02⁄06⁄2011    JULGADO: 02⁄06⁄2011
Relator
Exmo. Sr. Ministro  LUIS FELIPE SALOMÃO
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA
Subprocuradora-Geral da República
Exma. Sra. Dra. ANA MARIA GUERRERO GUIMARÃES
Secretária
Bela. TERESA HELENA DA ROCHA BASEVI
AUTUAÇÃO
RECORRENTE    :    ÉLIO MÁRIO OPPELT - ESPÓLIO
REPR. POR    :    VERA LÚCIA OPPELT - INVENTARIANTE
ADVOGADO    :    FABIANA FRANCO TRINDADE E OUTRO(S)
RECORRIDO    :    HELENA THEREZA OPPELT
ADVOGADO    :    LUIZ CLEBER MARTINS DA SILVA E OUTRO(S)
ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Sucessões - Inventário e Partilha

CERTIDÃO
Certifico que a egrégia QUARTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Turma, por unanimidade, deu provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Raul Araújo, Maria Isabel Gallotti e João Otávio de Noronha votaram com o Sr. Ministro Relator.