quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Georreferenciamento é obrigatório em ações judiciais de imóvel rural independente de sua área

 

 

DÚVIDA. ESCRITURA PÚBLICA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL RURAL. GEORREFERENCIAMENTO. OBRIGATORIEDADE, INDEPENDENTEMENTE DA DIMENSÃO DA ÁREA.

Obrigatoriedade do georreferenciamento, independentemente da dimensão da área, nos termos do artigo 2º do Decreto nº 5.570/2005. Necessária a identificação do imóvel rural, objeto do pedido, nos termos do § 3º do art. 225 (Lei n. 6.015/1973).

Cabe ao adquirente o cumprimento do disposto na lei 10.267/01, regulamentada pelos Decretos 4.449/02 e 5.570/05.

Apelo desprovido. Unânime.

 

 

 

 

Apelação Cível

 

Vigésima Câmara Cível

Nº 70 040 904 302

 

Comarca de São Borja

WILMAR HAMMERSCHIMIT,

 

APELANTE;

OFICIAL DO REGISTRO DE IMOVES,

 

APELADO.

 

ACÓRDÃO

 

Vistos, relatados e discutidos os autos.

 

Acordam os Desembargadores integrantes da Vigésima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em negar provimento ao apelo.

 

Custas na forma da lei.

 

Participaram do julgamento, além do signatário (Presidente), os eminentes Senhores Des. Glênio José Wasserstein Hekman e Des.ª Walda Maria Melo Pierro.

 

Porto Alegre, 06 de julho de 2011.

 

 

DES. RUBEM DUARTE,

Presidente e Relator.

 

RELATÓRIO

Des. Rubem Duarte (presidente e RELATOR)

 

WILMAR HAMMERSCHIMIT interpôs apelação contra a sentença das fls. 58/61, a qual julgou procedente a dúvida suscitada pelo OFICIAL DO REGISTRO DE IMÓVEIS DE SÃO BORJA – IRINEU PIAZZA, perante a Vara Judicial de São Borja.

 

Em razões (fls. 62/68), alegou que o imóvel, objeto da dúvida, tem as mesmas características e confrontações do que consta do registro. Disse não ter havido a transferência da área total e sim: 429ha da matrícula 5.743; 16ha da matrícula 15.133 e 65ha.91a da matrícula 18.277 e, mesmo estando em condomínio com área superior a 1.648ha, nada impede o registro das escrituras, pois não adquiriu a área total. Sustentou que não haverá modificação dos limites, sendo que a descrição permanecerá a mesma na matrícula. Requereu o provimento do apelo.

 

Foi recebido o recurso e remetido a esta Corte.

 

O Ministério Público opinou pelo desprovimento do apelo.

 

É o relatório.

VOTOS

Des. Rubem Duarte (presidente e RELATOR)

 

Busca o apelante a modificação da sentença que julgou procedente a suscitação de dúvida ajuizada pelo Oficial do Registro de Imóveis de São Borja.

 

O apelante é proprietário de área superficial de 429ha da matrícula 5.743; 16ha da matrícula 15.133 e 65ha.91a da matrícula 18.277 e, estando em condomínio com área superior a 1.648ha, conforme se depreende das informações prestadas por ele.

 

Para o registro da escritura – conforme pretensão do apelante - há a necessidade da observância do que dispõe a legislação aplicável à espécie: Lei 10.267/2001, regulamentada pelo Decreto 4.449/02 e Decreto 5.570/05.

 

Ademais, considerando que a ação foi proposta em 2009, ou seja, após a entrada em vigor do Decreto n. 5.570/2005, é obrigatória a realização de georreferenciamento, qualquer que seja a dimensão da área, conforme dispõe o § 3º do art. 225 da Lei n. 6.015/1973, com a redação dada pela Lei n. 10.267/2001.

 

O art. 2º do Decreto n. 5.570/2005 estabelece que a identificação do imóvel rural objeto de ação judicial prevista no § 3º do art. 225 da Lei n. 6.015/1973 deve ser exigida imediatamente, qualquer que seja a dimensão da área em ações ajuizadas a partir da publicação do Decreto:

 

 

“Art. 2º. A identificação do imóvel rural objeto de ação judicial, conforme previsto no § 3º do art. 225 da Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973, será exigida nas seguintes situações e prazos:

I – imediatamente, qualquer que seja a dimensão da área, nas ações ajuizadas a partir da publicação deste Decreto; (...).”

 

Dispõe também o § 3º do art. 225 da Lei n. 6.015/1973, redação dada pela Lei n. 10.267/2001:

 

“Art. 225.(...).

 

§ 3º. Nos autos judiciais que versem sobre imóveis rurais, a localização, os limites e as confrontações serão obtidos a partir de memorial descritivo assinado por profissional habilitado e com a devida Anotação de Responsabilidade Técnica – ART, contendo as coordenadas dos vértices definidores dos limites dos imóveis rurais, geo-referenciadas ao Sistema Geodésico Brasileiro e com precisão posicional a ser fixada pelo INCRA, garantida a isenção de custos financeiros cuja somatória da área não exceda a quatro módulos rurais.”

 

Nesse sentido esta Câmara já se pronunciou:

 

AGRAVO DE INSTRUMENTO. REGISTRO DE IMÓVEIS. RETIFICAÇÃO. OBRIGATORIEDADE DA REALIZAÇÃO DE GEORREFERENCIAMENTO, INDEPENDENTEMENTE DA DIMENSÃO DA ÁREA CUJO REGISTRO IMOBILIÁRIO SE PRETENDE RETIFICAR. DECRETOS NS. 4.449/2002 E 5.570/2005. OFÍCIO-CIRCULAR N. 123/2007-CGJ. O art. 2º do Decreto n. 5.570/2005 especifica que a identificação de imóvel rural objeto de ação judicial prevista no § 3º do art. 225 da Lei n. 6.015/1973 e proposta a partir da publicação do referido Decreto deve ser exigida imediatamente, qualquer que seja a dimensão da área. Obrigatória, portanto, a realização de georreferenciamento na hipótese dos autos, porque proposta, a ação, mais de um ano depois de publicado o Decreto n. 5.570/2005. RECURSO DESPROVIDO. (Agravo de Instrumento Nº 70022778906, Vigésima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Aquino Flores de Camargo, Julgado em 30/07/2008)”.

 

Tornou-se, portanto, obrigatória a realização de georreferenciamento, nos casos de transferência, desmembramento, remembramento e parcelamento de imóveis rurais, a identificação da propriedade rural a partir de memorial descritivo, assinado por profissional habilitado e com a devida ART (artigo 10, redação dada pelo Decreto 5.570/05).

 

Neste sentido a disposição do artigo 10 referido:

 

“Art. 10. A identificação da área do imóvel rural, prevista nos §§ 3º e 4º do art. 176 da Lei nº 6.015, de 1973, será exigida nos casos de desmembramento, parcelamento, remembramento e em qualquer situação de transferência de imóvel rural, na forma do art. 9º, somente após transcorridos os seguintes prazos:

 

Assim, não cumprido pelo apelante o disposto na Lei 10.267/01, regulamentado pelo Decreto 4.449/02 e Decreto 5.570/05, correta a sentença de procedência da ação.

 

A sentença fundamentou:

 

“O Decreto nº 4.449, de 30.10.2002, regulamentou a Lei nº 10.267/2001, que alterou dispositivos das Leis nºs 4.947/1966, 5.868/1972, 6.015/1973, 6.739/1979 e 9.393/1996, referente ao georreferenciamento, tornando obrigatório, nos casos de transferência, desmembramento, remembramento e parcelamento de imóveis rurais, a identificação da propriedade rural a partir de memorial descritivo.

A Lei n 6.015/73, com a alterações pertinentes, passou a viger com a seguinte redação:

Art. 176 - O Livro nº 2 - Registro Geral - será destinado, à matrícula dos imóveis e ao registro ou averbação dos atos relacionados no art. 167 e não atribuídos ao Livro nº 3. (Renumerado do art. 173 com nova redação pela Lei nº 6.216, de 1975).

        Parágrafo único - A escrituração do Livro nº 2 obedecerá às seguintes normas:

        § 1º A escrituração do Livro nº 2 obedecerá às seguintes normas: (Renumerado do parágrafo único, pela Lei nº 6.688, de 1979)

        I - cada imóvel terá matrícula própria, que será aberta por ocasião do primeiro registro a ser feito na vigência desta Lei;

        II - são requisitos da matrícula:

[...]

        3) a identificação do imóvel, que será feita com indicação: (Redação dada pela Lei nº 10.267, de 2001)

        a - se rural, do código do imóvel, dos dados constantes do CCIR, da denominação e de suas características, confrontações, localização e área; (Incluída pela Lei nº 10.267, de 2001)

[...]

        § 3o Nos casos de desmembramento, parcelamento ou remembramento de imóveis rurais, a identificação prevista na alínea a do item 3 do inciso II do § 1o será obtida a partir de memorial descritivo, assinado por profissional habilitado e com a devida Anotação de Responsabilidade Técnica – ART, contendo as coordenadas dos vértices definidores dos limites dos imóveis rurais, geo-referenciadas ao Sistema Geodésico Brasileiro e com precisão posicional a ser fixada pelo INCRA, garantida a isenção de custos financeiros aos proprietários de imóveis rurais cuja somatória da área não exceda a quatro módulos fiscais. (Incluído pela Lei nº 10.267, de 2001)

        § 4o A identificação de que trata o § 3o tornar-se-á obrigatória para efetivação de registro, em qualquer situação de transferência de imóvel rural, nos prazos fixados por ato do Poder Executivo. (Incluído pela Lei nº 10.267, de 2001)

[...]

Art. 225 - Os tabeliães, escrivães e juizes farão com que, nas escrituras e nos autos judiciais, as partes indiquem, com precisão, os característicos, as confrontações e as localizações dos imóveis, mencionando os nomes dos confrontantes e, ainda, quando se tratar só de terreno, se esse fica do lado par ou do lado ímpar do logradouro, em que quadra e a que distância métrica da edificação ou da esquina mais próxima, exigindo dos interessados certidão do registro imobiliário. (Renumerado do art. 228 com nova redação pela Lei nº 6.216, de 1975).

Ainda, o art. 10 do Decreto 4.449/2002 regulamenta a conduta dos oficiais de registros nos casos como o ora analisado:

Art. 10.  A identificação da área do imóvel rural, prevista nos §§ 3o e 4o do art. 176 da Lei no 6.015, de 1973, será exigida nos casos de desmembramento, parcelamento, remembramento e em qualquer situação de transferência de imóvel rural, na forma do art. 9o, somente após transcorridos os seguintes prazos: (Redação dada pelo Decreto nº 5.570, de 2005)

        I - noventa dias, para os imóveis com área de cinco mil hectares, ou superior;

        II - um ano, para os imóveis com área de mil a menos de cinco mil hectares;

         III - cinco anos, para os imóveis com área de quinhentos a menos de mil hectares; (Redação dada pelo Decreto nº 5.570, de 2005)

        IV - oito anos, para os imóveis com área inferior a quinhentos hectares. (Redação dada pelo Decreto nº 5.570, de 2005)

        § 1o  Quando se tratar da primeira apresentação do memorial descritivo, para adequação da descrição do imóvel rural às exigências dos §§ 3o e 4o do art. 176 e do § 3o do art. 225 da Lei no 6.015, de 1973, aplicar-se-ão as disposições contidas no § 4o do art. 9o deste Decreto. (Redação dada pelo Decreto nº 5.570, de 2005)

        § 2o  Após os prazos assinalados nos incisos I a IV do caput, fica defeso ao oficial do registro de imóveis a prática dos seguintes atos registrais envolvendo as áreas rurais de que tratam aqueles incisos, até que seja feita a identificação do imóvel na forma prevista neste Decreto: (Redação dada pelo Decreto nº 5.570, de 2005)

        I - desmembramento, parcelamento ou remembramento; (Incluído pelo Decreto nº 5.570, de 2005)

        II - transferência de área total; (Incluído pelo Decreto nº 5.570, de 2005)

        III - criação ou alteração da descrição do imóvel, resultante de qualquer procedimento judicial ou administrativo. (Incluído pelo Decreto nº 5.570, de 2005)

Impende registrar que a necessidade do georreferenciamento se faz tanto nas transmissões da área total, como também nas parciais.

In casu, as três frações de terras adquiridas pelo suscitado tratam-se de partes ideais de uma área maior, com 1.648ha93a85ca77ma, sendo necessário o georreferenciamento para possibilitar o registro junto ao Cartório de Registro de Imóveis, mesmo estando já escrituradas.

A fim de evitar tautologia, transcreve parte do parecer ministerial, que analisou percucientemente a questão:

Observa-se típica situação de desmembramento, derivada da divisão de imóvel rural até então em condomínio de herdeiros, havendo expressa previsão de que, nesses casos, é necessário o levantamento geodésico.

Ademais, o fato de as matrículas de nº. 5.742 e 15.133 não referirem a comunhão com área maior não tem o condão de afastar a incidência da norma que diz com a obrigatoriedade do georreferenciamento, que se configura em uma limitação administrativa, de caráter impositivo, geral, e de ordem pública.”

Nesse contexto, restou perfectibilizada hipótese de incidência dos dispositivos legais supracitados, que exigem a adaptação do título à descrição georreferenciada da totalidade do imóvel.

Assim, obrigatória, no caso dos autos, a realização de georreferenciamento nas áreas adquiridas através da Escritura Pública nº. 16.330 para o devido registro.

Isso posto, JULGO PROCEDENTE A DÚVIDA SUSCITADA, declarando correta a negativa do Oficial do Registro de Imóveis. “

 

Diante disso, não resta outra alternativa senão manter a sentença de lavra da Dra. Mônica Marques Giordani, razão pela qual nego provimento ao apelo.

 

É o voto.

 

 

 

Des. Glênio José Wasserstein Hekman (REVISOR) - De acordo com o(a) Relator(a).

 

Des.ª Walda Maria Melo Pierro - De acordo com o(a) Relator(a).

 

 

DES. RUBEM DUARTE - Presidente - Apelação Cível nº 70040904302, Comarca de São Borja: "NEGARAM PROVIMENTO. UNÂNIME."

 

 

Julgador(a) de 1º Grau: Dra. MONICA MARQUES GIORDANI

 

 

 

Citação: Apelação Cível Nº 70040904302, Vigésima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rubem Duarte, Julgado em 06/07/2011