terça-feira, 10 de abril de 2012

Leilão: diferença de tamanho no imóvel

 

compra e venda. leilão. abatimento do preço. venda ad corpus OU AD MENSURAM. diferenciação. A prova dos autos conduz à negociação ad corpus. Dano moral configurado em face de inscrição indevida em bancos de dados de informações creditícias.

apelação da autora desprovida. apelo do banco parcialmente provido. recurso adesivo não-conhecido.

 

 

Apelação Cível

 

Décima Sétima Câmara Cível

Nº 70018539932

 

Comarca de Porto Alegre

MARCIA PIRES BARBOSA

 

APELANTE/RECORRENTE ADESIVO

BANCO BRADESCO S/A

 

APELELANTE/RECORRIDO ADESIVO/APELADO

 

ACÓRDÃO

 

 

Vistos, relatados e discutidos os autos.

 

Acordam os Desembargadores integrantes da Décima Sétima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em negar provimento ao apelo da autora, dar parcial provimento ao apelo do banco e não conhecer do recurso adesivo.

 

Custas na forma da lei.

 

Participaram do julgamento, além da signatária (Presidente), os eminentes Senhores Des. José Aquino Flôres de Camargo e Des. Alzir Felippe Schmitz.

 

Porto Alegre, 23 de agosto de 2007.

 

 

 

DES.ª ELAINE HARZHEIM MACEDO,

Presidente e Relatora.

 

 

RELATÓRIO

 

Des.ª Elaine Harzheim Macedo (PRESIDENTE E RELATORA)

 

Trata-se de recursos interpostos da decisão que julgou improcedente a Ação Ordinária interposta por Márcia Pires Barbosa em face de Banco Bradesco S/A. A sentença também julgou parcialmente procedente a Ação de Indenização interposta por Márcia Pires Barbosa em face do Banco Bradesco S/A. Condenou o réu ao pagamento de R$ 21.000,00 por danos morais causados à autora. Fixou sucumbência (fls. 215-229).

 

Em suas razões de apelo (fls. 237-243), a demandante insurge-se contra a decisão de primeiro grau, reputando abusiva a cláusula ad corpus. Aduz que há diferença de 21,7% entre a área anunciada e a existente efetivamente. Postula o abatimento proporcional do preço. Preparo à fl. 244.

 

Por sua vez, em suas razões de apelo (fls. 247-257), a instituição bancária afirma que inscreveu o nome da autora junto aos cadastros restritivos do crédito em face da ausência de pagamento de uma das parcelas. Fala que não poderia fazer ou deixar de fazer algo sem que fosse determinado pelo juízo. Diz que agiu no exercício regular do direito. Requer a reforma da decisão, ou alternativamente, a diminuição do valor fixado na sentença. Preparo à fl. 258.

 

Nas fls. 269-272, a autora apresenta recurso adesivo, o qual foi igualmente recebido na instância monocrática.

 

Com as respectivas contra-razões, subiram os autos a esta Corte, vindo conclusos após redistribuição.

 

É o relatório.

 

VOTOS

 

Des.ª Elaine Harzheim Macedo (PRESIDENTE E RELATORA)

 

A controvérsia dos autos está calcada em saber se a venda a ser rescindida foi ad corpus ou ad mensuram. Orientando a decisão, no ponto, pela prova dos autos, corroborando a posição do juízo sentenciante, entende-se ter sido o negócio jurídico celebrado ad corpus.

 

O imóvel em questão é o apartamento nº 602, Edifício Villa Splendore, sito na Rua Desembargador Alves Nogueira, nº 223, de frente, com área privativa de 147,81m², nesta Capital, tudo conforme matrícula nº 120.525 – certidão do Cartório de Registro de Imóveis de fl. 44. Tal imóvel foi arrematado em leilão promovido pelo banco demandado (fls. 12-13). Formalizado o contrato de promessa de compra e venda – fls. 08-11 – a autora comprometeu-se a pagar R$ 182.000,00 da seguinte maneira: R$ 36.400,00 de sinal e o saldo de R$ 145.600,00, a ser pago em 12 parcelas de R$ 12.133,33, vencendo-se a primeira em 29-04-03 e a última em 29-03-04.

 

A presente ação busca o abatimento proporcional do preço e a devolução dos valores pagos a maior, já que existente uma diferença de 31,90 m² a menos na área do apartamento, conforme perícia judicial de fls. 144-155.

 

A autora alega que ao imitir-se na posse do imóvel, o qual estava ocupado quando da arrematação, contratou os serviços de uma arquiteta a fim de medir o bem. Encontrou a diferença de 29,72m² para menos. Alega que só arrematou o imóvel – com preço inicial de 95.000,00 – em face de sua área.

 

Já, o banco demandado alega que somente reproduziu nos editais de leilão as dimensões constantes na matrícula do apartamento. Aduz, ainda, que estava especificado no edital e no contrato de promessa de compra e venda que o negócio se daria ad corpus.

 

Não merece provimento o apelo.

 

Da prova carreada aos autos emerge a verdadeira intenção da compradora no sentido de adquirir um apartamento bem localizado, em zona nobre da cidade e buscando pagar um preço menor que o de mercado, já que adquirido por meio de leilão. Assim, a metragem do apartamento pode ter sido um dos motivos que levou a autora à arrematação do bem, mas não o motivo principal. Ora, tal imóvel sendo ofertado por um preço muito inferior ao de mercado é o maior atrativo do negócio realizado. E quem arremata um bem em leilão, bem sabe dos percalços de tal negociação, ainda mais quando o apartamento estava ocupado, conforme a própria recorrente afirma. Assim, se não viu in loco o imóvel, assumiu o risco, pois poderia ter se valido dos meios cabíveis para tal providência, aceitando, pois, as condições impostas pelo tipo de alienação, em leilão. Dizendo de outra forma, a aquisição, nesses termos, é um conjunto de bonus, mas que acarreta os conseqüentes ônus. Agrega-se a isso que do edital do leilão consta expressamente que a venda se daria ad corpus (fls. 32/33).

 

Mas há mais, pois o que releva, in casu, é o efetivo ajuste, expressa ou tacitamente, formalizado entre as partes alienante e adquirente, situação que caracteriza o acordo de vontades ínsito na transação sub judice, irrelevante que tenha a transação ocorrido, no particular, sob a forma de arrematação em sede de leilão de bens havidos pelo banco como pagamento de dívidas de natureza hipotecária.  E, nesse aspecto, não há qualquer sombra de dúvida que a transferência de bem se deu sob a forma ad corpus. Rigorosamente nem alienante (mero credor, que recebeu os imóveis como forma de quitação de dívida) nem adquirente conheciam o imóvel arrematado, que no passado há havia sido recebido como entrega ad corpus, daí porque também assim se comportando a arrematação e a tanto se vinculando a vontade da arrematante.

 

Significativa parte da doutrina adotou o entendimento de que as vendas ad corpus representariam a regra geral, sendo, na dúvida da forma como a contratação se realizara, presumível, cabendo à parte que alega sua concretização como sendo venda ad mensuram o ônus da prova, nos termos do art. 333 do CPC. A ausência dessa consignação é gritante, tanto no edital como no pré-contrato firmado entre as partes. Sem embargo, porém, de não se endossar, em tese, esse entendimento, quando controvertida a questão da fixação do preço, o que se revela importante é o exame de todos os elementos que circunstanciaram a transação efetuada.

 

É a própria lei reconhece o caráter enunciativo quando refere o contrato as dimensões do imóvel, ausente a discriminação do preço por medida. É o que diz MARIA HELENA DINIZ, baseada nas decisões publicadas na RT 614/63, 503/81, 520/165, 489/99, 181/94, 182/689 e 185/708, EJSTJ 16/57 e RF 167/242, 158/168, 132/146 e 222/193, para quem:

 

“a venda ad mensuram é aquela em que se determina a área do imóvel vendido, estipulando-se preço por medida de extensão” in “Código Civil Anotado”, 5a. edição, Editora Saraiva, São Paulo, 1999, p. 802).

 

Para SÍLVIO RODRIGUES in “Direito Civil”, vol. 3, 11a edição, Editora Saraiva, São Paulo, p. 170:

 

“tem-se entendido ser a referência à medida meramente enunciativa, quando vem acompanhada da locução ‘mais ou menos, quando a coisa vendida é designada por limites certos, quando o imóvel está murado ou cercado, e ainda quando há especificação ou nomeação de confinantes”.

 

Mesmo que a metragem registrada no contrato não represente a efetiva área real do imóvel, para o banco, ora demandado, era como se tal assim fosse, pois assim também se mostrou os atos anteriores que deram origem à sua titularidade e que antecederam a transação. E se a metragem do apartamento leiloado pela instituição bancária está aquém daquela constante do registro de imóveis, por certo não é o banco o responsável por isso. Somente negociou nos precisos termos que estavam consignados no registro imobiliário, assim os colocando à venda, conforme edital antes mencionado.

 

Assim sendo, a natureza do negócio realizado entre as partes, arrematação do imóvel em questão, obedeceu a modalidade ad corpus, ou seja, a negociação foi por corpo certo, sendo a metragem estabelecida no contrato apenas de caráter descritivo, sem relevância para a fixação do preço do imóvel.

 

Destarte, não demonstrado pela apelante que a venda foi feita ad mensuram, mas, ao revés, evidenciada pela prova dos autos a ocorrência de venda ad corpus, a improcedência da demanda é medida impositiva.

 

E no que tange à demanda indenizatória, tem-se por evidente o dano moral sofrido pela demandante.

 

Efetivamente teve ela seu nome inscrito no rol de maus pagadores quando havia depositado judicialmente o valor das parcelas e disso a instituição bancária tinha ciência (fl. 25 dos autos apensos). Isso ocorreu em 09-09-03. Em 20-10-03 ocorreu a inscrição. Evidenciado, portanto, o agir ilícito do banco demandado.

 

Adriano de Cupis, autor italiano, em sua obra chamada Il Dano, afirma que, o dano moral se divide em objetivo e subjetivo. Dizendo que o dano moral subjetivo é aquele que atinge bens jurídicos ligados à intimidade psíquica da pessoa, causando a dor, o sofrimento, a depressão. Já o dano moral objetivo é aquele que ataca a honra, a imagem, a reputação da pessoa no meio social.

 

No entanto, não sendo possível a restitutio in integrum em razão da impossibilidade material desta reposição, transforma-se a obrigação de reparar em uma obrigação de compensar, haja vista que a finalidade da indenização consiste, justamente, em ressarcir a parte lesada.

 

Nesse sentido, se sabe que a quantificação do dano moral é tarefa extremamente difícil, porque a lei não indica parâmetros, cabendo ao magistrado fixá-la por arbitramento. A fixação do quantum indenizatório tem, portanto, caráter subjetivo, sendo a culpa do agente, a capacidade econômica do ofensor e a extensão do prejuízo causado, elementos que devem balizar a quantificação do dano.

 

Relativamente ao quantum fixado pela sentença, no caso dos autos, levando-se em conta o efeito pedagógico e também o caráter ressarcitório, com a análise da situação financeira de ambas as partes, até para evitar o enriquecimento indevido, entende-se por bem reduzir tal valor. Portanto, vai o dano moral arbitrado em R$ 10.000,00.

 

Por fim, o recurso adesivo interposto pela demandante não deve ser conhecido, já que manejou recurso de apelação principal. Assim, ocorreu a preclusão consumativa, não se devendo conhecer da insurgência adesiva.

 

Diante do exposto, nega-se provimento ao apelo da autora, dá-se parcial provimento ao apelo do banco e não se conhece do recurso adesivo, mantendo-se a verba sucumbencial fixada na sentença.

 

É a decisão.

 

 

 

Des. Alzir Felippe Schmitz (REVISOR) - De acordo.

 

 

Des. José Aquino Flôres de Camargo - De acordo.

 

 

DES.ª ELAINE HARZHEIM MACEDO - Presidente - Apelação Cível nº 70018539932, Comarca de Porto Alegre: "NEGARAM PROVIMENTO AO APELO DA AUTORA E DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DO BANCO. RECURSO ADESIVO NÃO CONHECIDO. UNÂNIME."

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Julgador(a) de 1º Grau: NARA ELENA SOARES BATISTA

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